quarta-feira, 25 de junho de 2014

Nós Dois


 

Foi o meu primeiro beijo

Ou o meu último instante

Senti um infinito desejo

Puro o Eu, ou só amante

 

O tempo continuou

A distância se estendeu

Minha boca nunca falou

Meu peito nunca esqueceu

 

Hoje eu ando pelas estrelas

Ela com os pés no chão

Minha estrada é sem janela,

Encruzilhada pro coração

 

Às vezes me bate o juízo

Eu pulo na casa dela

Chego sem dar aviso,

E alimento a sua brasa

 

O fogo que nos concebeu

Caminha em trilho perdido

Sei que ela não percebeu

Nosso amor é sem sentido

 

Um do outro, o contraponto

Agarramos o tempo com navalha.

Vamos vivendo o nosso conto

Entre desencontros e igualhas

 

(Iberê Martí)

Poema do fim


Eu sou assim, desse jeito

Um Sujeito sem graça e

Sem jeito.

Eu não quero morrer

E não espero matar

Não me pressas prometer

Nem me convencer a ficar.

Eu não sou de vencer,

Tão pouco dou asas,

Ao azar.

 

Eu sou assim, sem segredo
Às vezes fico azedo,

E me enveredo com o Medo.

Fazer o que, se sou assim?

Carrego na ponta do pé,

O meu coração...

Faço gol de bico ou tropeço

[caio, de cara, levanto]

Vou assim da minha maneira

Sem média, levanto poeira

E assopro no vento o encanto

 

Eu sou assim, sem fim nem começo

Ao avesso, me despeço em reticências

E me arremesso pra continuar!

 

(Iberê Martí)

Rainha do Meu Carnaval


 

Eu vi o teu rosto amuado
Como a flor de maio que não abriu
Senti o teu sorriso calado
Como o vento-sul no norte do Brasil
E eu te fiz, flor-de-liz
E pedi bis, e por um triz,
Eu quis mais...

 

Tocar teu coração gelado
Como o nascer do sol no inverno
Sentir o teu corpo colado
Como um bebê num abraço materno
E eu te espero, é vero
E num bolero, sincero
Eu te quero...

 

Ouvindo as minhas trovas
Como princesa de palácio medieval
Sambando canções novas
Como a rainha do meu carnaval
Sensacional, um sarau
Só o nosso carnaval
Sem final...

 

(Stéphano Diniz)

segunda-feira, 23 de junho de 2014

Quando eu lágrima


 

Se ela soubesse

Que tenho um segredo

Eu não posso revelar

Que eu tenho medo,

Muito medo do azar

 

Se ela soubesse

O enigma da vida

Sem se preocupar.

Nosso futuro incerto

E eu aprender a voar

 

Se ela soubesse

As minhas incertezas

Pra no mundo acordar

Livre de toda maldade

E sobreviver de cantar

 

Se ela soubesse

Está vontade que tenho

Teu sorriso carregar

Pra tudo que é eterno

E pra sempre amar

 

Se ela soubesse

Misteriosas alegorias

Sonho que imaginar

Vou preencher fantasias

E de alegrias lhe inundar

 

Se ela soubesse

Da lágrima que desce

Outro plano navegar

Quem nunca esquece

Viver de lhe encantar

 

(Iberê Martí)

sábado, 21 de junho de 2014

reminiscência


 

Fragmento desbotada, sonha?

Uma noite confusa, sem fim

Madrugada, perfume indecifrável

Em meu rosto, ser risonho

 

Rabisco, rascunho rasgado

Este desejo interminável,

Um prazer imprescindível

Meu peito doce, salgado

 

Molhando madrugada, lençóis

Embaraço, oxitocina cintilante

Debruças, debaixo cima braços

Entreguem ao mundo, e sóis

 

O sol nasce, e nos escurece

Noite desce de qualquer maneira,

Resplandece, se torna pequena

Diante o início, e já amanhece

 

O passado volta ao seu lugar,

Descompasso que se desconhece

Um abraço, beijo sabor de primeiro

Instante de quem, última palavra rogar

 

(Iberê Martí)

sexta-feira, 20 de junho de 2014

Tudo passar


 

Tah lá viu

Oh, flor de abril,

que se abriu

Em meu Peito

Teu leito

Nosso leite

Derramado

Na cama, na lama

Na fama...

Nossa sentença

 

Tah lá viu

No tribunal

No juízo dos homens

Na boca dos nobres

Na mesa dos pobres

Na fome do burguês

Na inocência do freguês

Na decência do camponês

E na mãe que tira da boca,

pra alimentar o filho pagão

 

Tah lá viu

Na estrutura

No imposto do Estado

Na privada, privada

Na ganancia mal paga

Na exploração infantil

No poeta servil

No sistema a pedir,

Ao mendigar esmola

 

Tah lá viu

Na mente

Quem mente que controla

Que trolla por cima

Que esquece a rima

E vive sem nada.

Que chora há amada,

O tempo que quis

Passou, padeceu

Sem “poder” ser feliz

 

(Iberê Martí)

EM SOLO ÁRIDO


 

Antes de partir,

Leve de mim tuas lembranças,

Se não vivo a reviver-te,

Matando, aos poucos, a mim....

 

Antes de partir,

Não me deixe aos pedaços,

E leve de mim a esperança,

Alforriando-me de tuas recordações...

 

Mas se não foi assim que a vida seguiu,

E partiu me partindo aos pedaços,

Sugando de meu corpo a alma

Te digo: mesmo assim sobrevivi...

 

E se o choro foi a busca do passado,

Dele me esvaziei a cada lágrima,

Em cada sonho que não te sonhei,

Ressequindo-te em aridez...

 

A dor foi elixir de meu crescimento,

Teus restos, adubo de minha terra,

O desmoronamento, alicerce de minha alma,

Tua ida, o despertar da flor que há em mim...

 

(JOANA CAJAZEIRO)

quinta-feira, 19 de junho de 2014

Diagrama da vida


 

Percorra caminhos lentos

Somos todos iguais

Seja estranho no ninho

E sorria com os normais

 

Cante uma bela canção

Chore o tempo perdido

Ande na contramão

Esqueça por hora o perigo

 

Siga com passos de santo

Perdoe através de pecados

Console uma moça em pranto

Alimente um famigerado

 

Faça alguma escolha

Pra depois se arrepender

Rabisque uma folha

Da agenda dos sem poder

 

Dance com o gari

Peça esmola ao mendigo

Faça na lua um guri

E da Estrada um abrigo

 

Tome banho na chuva

Corra risco com os trovões

Passe direto na curva

Brinde no céu com aviões

 

Mande seu patrão tomar

Esqueça um dia rotina

Dê asas e voe, azar

Conquiste sua menina

 

Tenha tempo pra vida

Componha o firmamento

Faça papel com urtiga

Deixe na conta, sofrimento

 

Faça a esposa esperar

Pule de cima do prédio

Tome um gole no bar

E peça divórcio ao tédio

 

Abandone as convenções

Observe pela janela

Siga o seu coração

Cante um verso pra Ela

 

Faça tudo e esqueça

Cometa uma travessia

Antes que há vida anoiteça

Crie um abraço e bom dia!

 

(Iberê Martí)

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Paradoxo


 

Como pode um cachorro

Ao ver corrente e coleira

Se alegrar tanto?

Como pode a coleira

Significar liberdade?

 

Como pode um astronauta

Se libertar na vastidão do céu

Confinado numa nave espacial?

Como pode o confinamento

Significar a liberdade?

 

Como pode um casal

Ser livre, sendo a união

De dois corpos em um só?

Como pode o amor

Significar a liberdade?

 

Como pode uma pessoa

Querer viver com intensidade

Tendo medo de morrer?

Como pode o medo

Significar a liberdade?

 

(Stéphano Diniz)

terça-feira, 10 de junho de 2014

No que me encontrei


 

Sempre tive maior vocação pra peixe, que para ave

No fundo do rio minha imaginação se perdia.

Era como vasculhar o infinito, tocar o inalcançável

 A linha tênue do improvável iscada para o imprevisível

Virar canoa, de remo... cortar água o remador

Ouvir o banzeiro da ariranha, o bicho arisco

- que tudo promete e nada faz, peixe de embira–

 

Debruçava dias e horas ali; alimentando famigerados

Driblando os entreveros, escapulindo de garrancho

Foi assim que eu aprendi a ser livre.

As pássaros voam, mas quem enxerga mistério é peixe,

Quem ilumina fantasia e desafio é curva de rio

 

Minha mãe sempre dizia. Esse menino só toma sossego quando pesca.

Fui pescado pelo incompreensível, na dúvida é melhor duvidar.

Nisso um mandi ou chorão encastoado me deu um aviso:

Não me encontrei porque nunca desisti!

 

(Iberê Martí)

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Tempos de Azar


 

Vivo em tempos de azar

Eu não ganhei no bingo

Trabalhei no domingo

E até aquele mendigo

Já veio me importunar

 

Então fui parar num bar

E sem pagar pelo caneco

Veio o dono do boteco

Me xingou de marreco

E começou a me expulsar

 

Ouvi uma sirene berrar                                                           

A polícia me levou preso

Com ar de menosprezo

E nem meu cigarro aceso

Me deixaram pra fumar

 

Depois da fiança pagar

Eu perdi o meu emprego

A sogra não dá sossego

E até o meu chamego

Não quer mais chamegar

 

Precisando me acalmar

Perdi a grana na loteria

Do remédio pra azia

Que o dotô da drogaria

Falou pra mim tomar

 

Sem mais nada esperar

Estou na noite calada

Caminhando pelo nada

Pensando onde a estrada

Agora vai me levar

 

Eu paro, eu olho pro mar

Sinto um vazio profundo

Sei que sou um vagabundo

Não tenho nada no mundo

Mas tenho o brilho do luar

 

(Stéphano Diniz)

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Pra que serve a Poesia?


 

O poeta nasceu do nada, se fez ser em um antioficio,

Um tipo singular e plural de disfunção anacrônica.

Pra que serve um poeta? - Um poeta não serve a ninguém!

O poeta é um análogo de desserviço social,

Ele se importa muito mais com criptozoologia,

[que com formulas por inteiro de como ganhar dinheiro]

O poeta detesta os agudos, seu tom e meio é o infinito.

Não existe essência no poeta, pois ele vive de experiência

Ele se engana, se arrepende a todo instante, inconstantemente

Quando se declara é verdadeiro, quando declama é exagero

Nunca está presente, nem ausente... é um verbo em reticência

 

E por essas e outras que tenho certeza absoluta...

A Poesia não serve pra nada... e um entulho, um empecilho,

Pra esse mar de gente normal, careta, séria e amarga!

 

(Iberê Martí)

quarta-feira, 4 de junho de 2014

Não Quero Ficar Sozinho


 

E se...

E se eu tivesse mais dinheiro

E se eu tivesse mais tempo

E se um dia o mundo inteiro

E se não houvesse lamento

E se fosse o amor verdadeiro

 

Quem sabe...

Quem sabe um dia melhora

Quem sabe o próprio veneno

Quem sabe em alguma hora

Quem sabe eu fosse pleno

Quem sabe também chora

 

As vezes...

As vezes eu me pergunto

As vezes, por que tanto medo

As vezes, de mudar o assunto

As vezes, não guardar segredo

As vezes, nós dois juntos

 

Quem sabe...

Quem sabe, um dia qualquer

Quem sabe, num dia bonito

Quem sabe, uma bela mulher

Quem sabe, dará o veredito

Quem sabe, saberá o que quer

 

As vezes

As vezes, eu não reconheço

As vezes, o que aconteceu

As vezes, eu não mereço

As vezes, não é pra ser meu

As vezes, eu não me entristeço

 

Mas não...

Mas não, mas eu não sei

Mas não, não conheço caminho

Mas não, creio que não lerei

Mas não, em nenhum pergaminho

Mas não, também não serei rei

Mas não, não quero ficar sozinho

 

(Stéphano Diniz)

terça-feira, 3 de junho de 2014

Místicos


 

Ascendem no espaço,

Gotas em ritmo de chuva

Melódico compasso,

As folhas das árvores

 

Um abraço frio

No céu sem estrelas,

Acalentam o vazio

Espero revê-las

 

Florescem no escuro

Colheitas verde maduro,

Ou são frutos de Saturno?

 

Há seiva de Marte,

O gosto do mate...

Vida é Selva radiante!

 

(Iberê Martí)

Guilhotina

 

Cacho de banana,

A cabeça penca.

Lâmina desce

Madura encrenca

 

Aqui não há sorte,

Castigo ou perdão.

Teu crime é a morte...

Quero teu coração

 

Debulham teu pescoço

Rolam seus juízos

A multidão se aglutina,

Es o sinal e o aviso

 

Morrer sem esperança,

Foi esta tua sentença

Viver sem lembrança

- sinal da cruz e continência!

 

(José Tamuya)