terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

A terra dos sem história




Andar afastado do mundo, em um universo paralelo as engrenagens pós-modernas é algo realmente fascinante. Fascina estar distante de tudo que tão somente se repete e se repete. Mas hoje, a quarta-feira de cinzas foi antecipada. Não. Nem que seja “arroz-de-festa”. Não. Não que importância tenha o carnaval e no que o mercado o transformou. Não. Não que importe o enredo de uma escola de samba, quanto (ou muito menos), qual escola vai ser campeã. Muito menos importância persiste em minha consciência sobre essas divisões geopolíticas. No entanto, o “fato” em si, da história misteriosamente ocultada é algo há se pensar. Por que escondem a história de um povo?
Ainda de manhã, no alvoroço da comunicação de nossa época: já se registrava incontentos com o desfile da escola de samba mangueira e sua grande homenageada Cuiabá. Curiosidade logo invadiu o peito, e até o samba enredo foi buscar um maior entendimento. Logo de frente com aquelas palavras soltas, de um lugar abstrato: que homenagem é está há um povo: onde o povo homenageado não se encontra? Estranho escrever sobre tal assunto. Primeiramente por que não sou mato-grossense de nascença. Entretanto, meus primeiros passos foram ali. Aprendi a respeitar e cultuar este estado, e sua história (de antiga) invasão.
Os seus índios resistentes; seus caboclos destemidos; seu jeito diferente culturalmente de pensar e agir. Foi na escola agrícola no auge de meus catorze anos que encontrei com a cultura cuiabana. Logo me encantei com esse povo que chama mãe de “mamãe”, e pai de “papai”. Com essa língua rebelde, com seus passos leves de quem conhece a força temida do sol. Foi neste período que descobri que peixe é “pexe”. Que maxixe tem por todo canto espinho. Que cuia quando cai na água faz “bá”.
            Foi com esse povo ressabiado e matuto que aprendi que de coxo se faz também viola. Que antes de tudo e qualquer coisa é uma história de resistência, de luta, de peleja sertaneja. Do caboclo que vive isolado em seu sertão de águas imudáveis por determinada estação do ano. É mesmo afastado do contato direto com a midiática cruel e sedenta, logo que obtive notícia da homenagem a essa gente, fiquei de prontidão esperando conhecer novas histórias deste povo. Ledo engano. Plena insólita ilusão.  Este povo, essa gente, esta cultura, esta resistência não pertencem aos “donos de tudo”. (Aos fabricantes primários e primatas deste sonho de nação). Não que importe com esse egoísmo patriótico por cidade, estado, nação. Mas pelo fato de saber plenamente que quando se quer aniquilar uma cultura comece pela ideia. Elimine a ideia e imaginação, as crenças e que sobra de um povo? Muito pouco ou quase nada: que nos expliquem os ciganos.
            Tristonho mesmo é o “fato” que novidade alguma existe neste novo (nem tão novo), “ato”, ação atitude. Quantos povos aniquilados, dizimados e marginalizados aqui mesmo nas Américas (no coração central do planeta, como dizia o enredo do samba). Extrapole isto há outros continentes, outros povos. É que haja muita imaginação. Fato que os donos destas planícies no presente têm vergonha da cultura deste povo. Amam muito mais o ocidente, seu modelo civilizatório copiado do passado e portanto super desenvolvido. Têm repudio a esse palavreado misto de diversas origens e dos seus fluidos sons que se originam nas múltiplas variações de X e CH. De tudo isso que realmente importa? Se tu não consome o produto do mercado?
            O dia foi triste não por ver a escola que carreguei no coração durante a infância se entregar a tamanho desaprumo ao confundir, misturar e desvalorizar a memória e cultura de um povo. Uma escola de Chico, de Jamelão (este se contorcendo no céu). Não. Este foi fato de menos. Pouco importa se vendido. Pouco importa, ou muito menos o dinheiro público "investido" – iria para qualquer outra autopsia burguesa mesmo. É muito menos importa os vencedores do tempo atual. Pensam, acreditam que mataram as escolas de samba, que compraram e venderam a nossa história. Fingem saber de tudo e um pouco mais. Sabem todos esses de nada e um pouco menos. Por que a cultura da escola, e a escola a instituição há de permanecer: sobreviver a qualquer devaneio dos seres humanos do presente. Pouco menos importa com os “donos de tudo” a Viola-de-coxo e o “Pexe com maxixe no Coxipó da ponte”.
             Nada disto importa. No futuro envergonhado estão os seres humanos que conduzem o presente e as múltiplas facetas do senhor mercado. Foram infelizes – prefiro acreditar. Lá adiante, há história e a cultura do povo será cruel. Por que dinheiro compra a história que os livros contam. Mas jamais vão calar o sentimento de um povo. Viva a estação primeira de mangueira; viva a cultura cuiabana. O resto, o resto é mera ganância: dos que se acham donos do fio! Pois é o povo o Carpinteiro da história de um Universo sem fronteiras; onde um povo sonhador e labutador canta: - vote primo; deixe de moage: tchá mãe!


                                                                          (Iberê Martí)

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